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Tudo aquilo que não está datado nem pertence especificamente a um filho.

Visita surpresa

Colhida nas memorias da Silvia

Já era tradição, na época das férias de julho, esperar a prima que vinha de Porto Alegre para passar as férias comigo. A tia Odila, tendo se criado na roça, não queria que a filha perdesse as oportunidades de conviver com aquele estilo particular de vida, por isso dava um jeito de avisar o pai que a Fabíola estava chegando para mais umas férias, sempre com alguns dias de antecedência.
No entanto algo estranho começava a acontecer no mês de julho de 1992, a primeira semana já se passara e não havia chegado a comunicação para buscar a prima na rodoviária. De qualquer forma se ela vem darão um jeito de avisar ou na pior das hipóteses ela vai até o tio Pio e algum dos guris traz ela. Normalmente o recado vinha por algum conhecido no domingo durante a missa, alguém que tinha telefone, é claro, aí eu ou um dos guris ia até a rodoviária esperar o ônibus.
Como já ia quase para o fim da segunda semana eu estava começando a ficar preocupada. A minha missão, durante as férias, era de passar o tempo todo brincando com ela e defendendo ela dos monstros que tinha ao redor da casa como: porcos, galinhas, trator, vacas, grilos, formigas e terneiros.
– Ah! Eu ia me esquecendo. Ela tinha medo de tudo o que se mexia. Menos da água pois adorava tomar banho no rio, mas tinha medo de pegar os peixes na mão quando a gente ia pescar, e minhoca então nem pensar.
Enquanto isso, na cabeça da Fabíola no, auge de seus 12 anos, se passava “é hora de deixar de ser tratada como criança, chega de ficarem andando de lá pra cá por minha causa”. Fabíola este ano faria uma surpresa para Sílvia, para nona e para o tio Abel. Fez a mãe pensar que tinha mandado o recado de sua chegada mas não mandou dizer nada seria a “Visita surpresa”, se não tivesse polenta que chega azar, mas o gostinho de aprontar uma arte compensaria. Com a passagem comprada até Santa Maria, onde a prima Rosália tinha a incumbência de esperar na rodoviária e embarcá-la para Nova Palma, teve mais que tempo para planejar como iria concretizar a sua surpresa.
Com a chega prevista para as 14 horas dava mais que tempo para ir a pé tranquilamente até a casa da nona antes que escurecesse. Por que para a Fabíola em Nova Palma todas as pessoas eram boas, ao contrário da Capital, onde deveria tomar cuidados com estranhos. Ia ser uma surpresa e tanto, quase seis horas de viagem para planejar nos mínimos detalhes a chegada. O embarque foi tranquilo, a mãe recomendou ao motorista o cuidado com a filha e principalmente o cuidado de entregá-la a um parente em Santa Maria. Na cabeça da mãe, em Nova Palma, seria o Abel ou a Silvia ou, talvez, um dos guris, que a pegariam na Rodoviária. Na cabeça da filha, todo mundo me conhece na rodoviária e quase todos são parentes lá. Seria uma quebra de rotina, um dispeto, como diria o tio Lino, coerente com as tradições familiares.
– Ah! O gostinho de fazer uma arte. O plano. Chegando na rodoviária vou direto a Casa do Tio Pio, ter um dedo de prosa com a prima Janine, depois, como já sou mocinha, posso ir andando e daí é só caminhar tranquilamente até lá e… surpresa! Tempo para imaginar cada detalhe não faltou afinal foram quase seis horas sozinha naquele ônibus. A chegada a Nova Palma foi sem incidentes, eram quatorze e pouco, foi a casa do tio Pio e papeou com a prima Janine, que já estava de saída. Então falou para a Janine,que iria aproveitar a saída dela e iria andando. Vejo vocês na missa do domingo. E lá se foi pela estrada principal carregando a maleta.
– Não precisa caminhar muito depressa pois a ‘tarde ainda é criança’, tem muito tempo. Que legal poder caminhar curtindo a paisagem, a estrada deserta. Neste horário todo mundo estava na lavoura e como o tempo estava, bom tem que aproveitar principalmente para carpir as lavouras.

Toni (do Achiles) e Ana atravessando o rio pela pinguela improvisada enquanto a turma toma banho de rio.

Toni (do Achiles) e Ana atravessando o rio pela pinguela improvisada enquanto a turma toma banho de rio.

Na época tinha dois caminhos para chegar na casa do tio Abel: seguindo pela estrada atravessando o rio na ponte nova e descendo de volta pela escola ou descendo pela trilha da estrada velha atravessando o rio pela pinguela improvisada, que era muito mais curto, só tinha o inconveniente da pinguela. É claro que a segunda opção foi a escolhida, até porque depois de uma caminhada destas qualquer metro a menos de estrada faz diferença. Já estamos quase lá é só passar a cerca caminhar uns duzentos metros pelo potreiro do Valdecir Rossato atravessar o rio e pronto… Surpresa! Chiii! a surpresa veio antes. Do outro lado da cerca estão passando pequenos monstros com chifres que fazem bééé. Meu Deus e agora? Passar rapidamente a cerca de volta e fazer a volta pela ponte. Mas é longe, dá mais de um quilômetro, a mala está pesada. Ainda bem que aquelas cabras malvadas estavam passando, daqui a pouco,elas se vão e eu posso ir tranquila.
O que a menina moça não contava é que as cabras estavam pastando e não passando, o que começou a aumentar significativamente o tempo de espera. Pelo menos, ali perto da cerca, tinha uma pedra grande que dava pra sentar. Mas já está ficando tarde e aqueles bichos perigosos não vão embora, será que estão esperando uma vítima? Eu é claro. O sol começava a se pôr e logo iria escurecer. As cabras pastantes, seguiram a sua trilha e liberaram o caminho para a Fabíola seguir viagem …
– Ah, que alívio! – Agora posso ir e tem que ser depressa antes que anoiteça.
Fabíola Imaginou que teriam se passado varias horas, mas apos o episodio ao olhar no relógio percebeu que somente havia transcorrido míseros 20 minutos.
A panela da polenta já está com a água quase fervendo, a mãe, o pai e a nona tomam chimarrão na cozinha. Um dos guris está tirando água do poço. Os cachorros começam a latir como quando fazem festa para algum conhecido. Ouvimos um grito desesperado:
– Siiiiilvia! vem me salvar destes monstros que estão me atacando! Surpresa! é a Fabíola que chegou sem avisar.

A mula que não queria rezar

O Carlos já estava se sentindo o máximo com a história de matar a catequese e foi aí que me caiu no colo outra história que coloca a dele no bolso, ele não foi o primeiro na família…
Não sei se o numero três é mágico, mas tem a ver com as aventuras ligadas a catequese na família. Foi lá pelo ano de 1909 (três vezes três), os três filhos mais velhos do Giovanni Marco já estavam na idade de frequentar a catequese, nesta época já moravam na costa do Portela no caminho de Linha Base. A moradia ficava uns três quilômetros da matriz, uma distância um pouco grande para ser percorrida a pé pelas crianças, daí a opção de ir à cavalo, ou melhor à mula. A “mussa vecchia” era o meio de transporte dos irmãos, Beppi, Ângelo e Toni. Logo após o meio dia os três montavam a “mussa” e rumavam para a igreja para as aulas de catequese.

A “mula velha” era um animal extremamente pacífico e tranquilo, cobria o trajeto em aproximadamente quarenta minutos, ou seja, um pouco mais devagar do que um adulto anda a pé. A viagem era muito tranquila e permitia a contemplação da natureza no decorrer da mesma. Depois de ir e vir muitas vezes, o caminho já decorado, começava a perder a graça e a catequese, bem a catequese era uma obrigação, um compromisso, e apesar da educação religiosa e rigorosa, às vezes batia aquela vontade travessa de fazer algo diferente aos domingos à tarde. Achar uma desculpa plausível e razoável para faltar a catequese passou a ser uma tarefa dos meninos.

Licéia, Lucidio e Léia montados na tostada do tio Marcelino, um arranjo comum desde a época do meu avô, andar três ou mais crianças no cavalo. No finalzinho do vídeo eu e a Licéia no alazão do tio Aquiles.

Licéia, Lucidio e Léia montados na tostada do tio Marcelino, um arranjo comum desde a época do meu avô, andar três ou mais crianças no cavalo. No finalzinho do vídeo eu e a Licéia no alazão do tio Aquiles.


Não demorou muito, na observação do comportamento da mula eles descobriram que ela não gostava de ser contrariada, como por exemplo, ser acelerada, qualquer forma de instigação para que andasse mais de pressa ela fazia o contrário, parava. Empacava, e a partir disso não se mexia mais e se batessem nela, baixava a cabeça, se ajoelhava com as patas da frente e derrubava a gurizada no chão. O método, para matar a catequese, passou a ser: apertar os calcanhares na barriga dela para que ela parasse e a partir daí continuar tentando fazer ela andar até que ela decidisse derrubar o grupo, preferencialmente num lugar com barro. Sujos não tinham outra roupa para vestir aí não poderiam ir para a catequese, culpa da mula que tinha a mania de se ajoelhar.

O arrodeador de bandeira

Não fui capaz de determinar com precisão de onde surgiu o termo “bandeira” para designar o monte de espigas de milho colhido. Um costume ancestral na colheita do milho consiste em calcular o centro de um quadrado de lavoura de mais ou menos 6 braças (13,32 metros) de lado, colher as espigas neste centro deitar as canas, (hastes do pé de milho) e depois ir colhendo ao redor e jogando o milho no ponto inicial até ter um monte de espigas, conhecido como bandeira. Em biologia a ponta da haste terminada num penacho ou pendão, a flor masculina, é também chamada de bandeira. O ato de colher as espigas e deitar a haste também é chamada de deitar bandeira, talvez venha daí o nome bandeira para o monte de espigas colhidas. Até aqui apenas definimos o monte de milho colhido que depois era carregado na carroça, ou gaiota no caso do Lino, para ser levado para casa.
Gaiota, dirigida pela Leda, uns 15 anos após o episódio narrado.Quando fazia tempo bom era urgente a colheita para aproveitar o milho bem seco que durava mais no paiol, por isso era comum pedir ajuda de algum vizinho para acelerar a colheita, o nosso vizinho era, em geral, o seu Generoso, naquele dia pela manhã o Léo e eu estávamos na aula, O pai e o vizinho trabalharam desde bem cedinho, o tempo estava bom, e ao meio dia já carregaram uma gaiotada de milho que foi descarregada logo após o almoço. Em seguida voltaram para a lavoura, aquela que ficava entre o canavial e as fontes, desta vez o Léo e eu fomos juntos. Quase quatro horas tinha milho suficiente para carregar uma carga. Carregamos e o pai foi para casa descarregar e trazer a merenda, o chá das quatro. Um bule com chá de mate com leite e fatias de pão com chimia. Na volta além do lanche o Leonildo veio de carona, ele tinha na época uns oito anos, já participava de muitas atividades na lavoura, mas quebrar milho exigia bastante força nas mãos então ele ajudava mais no serviço de carregar.
Para fazer render o serviço, seu Generoso começava a bandeira um pouco mais longe, umas 10 braças, aí eu e o Leo íamos colhendo perto da bandeira e ele e o pai iam pelas beiradas, pois tinham mais força para atirar as espigas longe. Ele gostava de usar este método pois facilitava também na hora de recolher porque tinha montes (bandeiras) maiores o que significava menos paradas para carregar. Só tinha um inconveniente, em função da distância o milho ficava um pouco mais esparramado. Para resolver o problema bastava dar uma volta ao redor da bandeira jogando as espigas mais distantes para o centro, este trabalho se chamava “arrodear a bandeira.”
Estávamos no finalzinho do verãozinho de maio, os dias já começavam a encurtar prenunciando o inverno e tinha umas nove bandeiras para carregar e faltava um trecho pequeno para terminar a lavoura. Seu Generoso queria terminar a empreitada e o Léo e eu ajudávamos ele, o pai começava a carregar, e o dia ia chegando ao fim. As bandeiras ainda não tinham sido arrodeadas, o que dificultava o trabalho do pai, e iria dificultar mais ainda com o crepúsculo. Foi aí que seu Generoso pediu que o Leonildo arrodeasse as bandeiras enquanto nós terminávamos de quebrar o restinho do milho. O Leonildo respondeu prontamente a solicitação até porque não ficava bem desobedecer o vizinho, e lá se foi ele. Já começava a escurecer quando colhemos as últimas espigas, fomos então ajudar o Leonildo antes que escurecesse de vez. Passamos pela primeira e achamos muito milho esparramado, seu Generoso não disse nada, juntamos as espigas esparramadas e amontoamos no centro e fomos adiante. Na outra também tinha muito milho esparramado, aí ele falou que achava que o guri não estava enxergando direito. Repetimos a cena e quando caminhávamos para a terceira vimos uma cena que fez com que seu Generoso não parasse de rir por uma boa meia hora… O “arrodeador de bandeira” chegava naquele momento à quinta, e começava seu trabalho, deu uma volta pela esquerda e não satisfeito outra pela direita sem juntar uma espiga sequer e se foi em direção a próxima bandeira. Ele estava arrodeando as bandeiras… O Seu Generoso caiu na gargalhada. O Leonildo estava cumprindo ao pé da letra a ordem dada.

Os figos sagrados (modificado)

Já no final dos anos 50 o Toni começou a apresentar um problema de visão, até foi ventilado que provavelmente se tratava de cegueira noturna. Provavelmente era apenas um quadro de avitaminose A que fazia com que ele tivesse dificuldade de enxergar na penumbra. Por esta razão comprou uma égua a Zaina para ir aos ensaios de canto do padre Afonso Correa. Apesar disso o Bernardo não concorda muito com esta afirmativa.
Pelo sim pelo não uma das teteias do nono eram as frutas que ele cultivava, o parreiral sempre era mantido impecável, as laranjeiras da frente da casa, definiam o limite do terreiro, as bergamoteiras se espalhavam por diversos lugares e a figueira… Bem a figueira mesmo dando frutos sem vitamina, e por consequência, inócuos para a questão da cegueira noturna, a figueira era cuidada com um zelo especial, por duas razões: as folhas quando colocadas no alambique para destilar a cachacinha davam um sabor especial e os figos, estes eram um manjar dos deuses, que ele cuidava para que amadurecessem no pé, pois assim ficavam mais doces. Só quem já comeu um figo colhido totalmente maduro sabe o que é degustar uma delícia, diga-se de passagem, mais uma dádiva sagrada deixada pelo criador aos mortais.
No entanto um grande problema para os adoradores de figos, eu também sou um deles, é que muitos passarinhos e até aves maiores também tem uma atração especial por esta fruta e por isso é preciso vigilância constante ou alguns truques para poder saborear figos maduros. No Bom Retiro, no ano de 1963, atrás da casa, a figueira do Toni não era exceção à regra, passarinhos tentavam degustar os figos antes do proprietário, e se já não bastasse isso o galo de terreiro descobriu o sabor da tão cobiçada fruta e começou também ele a se banquetear pousado nos galhos da figueira. O Toni já enfrentava a gula das galinhas que atacavam os cachos mais baixos da uva e agora tinha que enfrentar o galo que também queria dividir a produção da figueira.
Como método para desestimular os comensais indesejados ele desenvolveu a técnica de jogar pedras, juntava alguma pedrinha com a canhota e jogava de forma certeira. Na maioria das vezes, depois de uma ou duas pedradas a ave aprendia que aquele era território proibido, o mesmo aconteceu com o galo comedor de figos. Mesmo assim os figos continuavam a desaparecer antes de estarem maduros no ponto que ele esperava. Chegou a passar quase o dia todo a vigiar a dita árvore e não conseguiu descobrir como galo conseguia roubar-lhe os figos, a esta altura já estava a desconfiar que pudesse ser um galo astuto treinado pelo Lino para fazer sacanagem, mas o Lino já estava fora há mais de 10 anos, talvez outro estivesse treinando o galo, de qualquer forma não era de dia que os figos eram roubados. A menos que o galo se recolhesse ao anoitecer e depois voltasse para comê-los. Já tinha passado e repassado todas as hipóteses e não chegara a nenhuma conclusão.
Já começava a anoitecer e as galinhas já estavam recolhidas, o Toni se dirigia à cozinha, onde a Nona preparava a água da polenta, quando ele ouviu um ruído vindo de trás da casa. (PS.:) Não esperou nenhum segundo e foi correndo em direção à árvore do paraíso, um vulto escalava a figueira em direção aos frutos quase amadurecidos. Neste momento precisava manter o sangue frio, já tinha sido afrontado por demais pelo galo de terreiro. Juntou uma bela pedra do chão e pensou consigo mesmo: – Quá comando mi. (Aqui eu mando). Ajustou da melhor forma a pedra na mão esquerda e lançou com vontade…

Foto da família aproximadamente da época do fato. Toni de chapéu e Bernardo um dos meninos de cócoras.

Foto da família aproximadamente da época do fato. Toni de chapéu e Bernardo um dos meninos de cócoras.

O pobre bicho deu um grito e despencou galhada abaixo, mas não era um galo. Xi acho que houve um problema! Foi até a figueira e não conseguindo ver direito arrastou o animalzinho desacordado até onde havia luz. Alertados pelo grito estranho já correram para fora o Abel, a Alzira e a Isa, ainda com a mescola da polenta na mão e uma lamparina. Era o Bernardo, meio desacordado e com um baita galo no meio da testa causado pela pedrada do nono. Galo! A esta altura o Toni não queria mais saber de ouvir falar em galo.

PS.: Quando o Bernardo leu a história ficou intrigado, pois não se lembra o que o nono disse ou fez para que ele descesse da figueira, agora só nos resta a confirmação ou a alteração da história pela tia Alzira. Isto modificaria o final da história, caso não tivermos nenhuma outra informação vou manter este final que combina com o estilo da família de reescrever finais para as histórias como o nono, o pai, o tio Pio e o tio Abel faziam magistralmente.

Abraço de tamanduá

Corria o ano de 1910 tranquilamente o quinteto de irmãos Bepetto, Ângelo, Toni, Valentin e Augustinho aproveitavam a entrada do inverno, quando a bicharada fica mais lenta por causa do frio, para perambular pelos matos e peraus. A vantagem de morar perto da floresta estacional semidecidual, isto é aquela onde algumas árvores derrubam as folhas no inverno, era que no inverno era mais fácil de circular pelo meio da mata e também mais fácil de encontrar animais. O Bepeto já tinha quatorze anos e o menorzinho o Augustinho já ia fazer seis e já acompanhava a trupe, porque não queria ficar em casa com a mãe gravida, a irmã e os menores o Guido e o Francisco. De qualquer forma as atividades não eram lá muito perigosas para uma criança, não tinha grandes animais ferozes nos matos daqueles peraus do vale do Portela. Certamente o Valentin e o Augustinho tinham certas dificuldades para subir em árvores pelos cipós, mas isso não era o problema quando se tratava de alguma caçada.

Peraus da costa do Portela mais de cem anos depois ainda  cobertos de mato

Peraus da costa do Portela mais de cem anos depois ainda cobertos de mato

Domingo de manhã o Giovanni levantava cedo para percorrer a pé os quase dois quilômetros para cantar a missa. A filharada ia de tarde para a catequese, pelo menos os três mais velhos. Neste contexto eles aproveitavam para fazer uma saída aventuresca na parte da manhã enquanto o pai não estava em casa. Uma atividade bastante divertida era (castrare le bisse), castrar as cobras. Isso mesmo, eles chamavam assim a atividade de pegar as cobras com uma taquara apertando levemente logo atrás da cabeça, depois um deles pegava a cobra bem pertinho da cabeça de tal forma que ela não conseguisse se virar e morder. A cobra abria a boca tentando morder e outro cortava a parte de baixo, a mandíbula, da cobra que era solta e saia se debatendo desesperadamente. Isso era feito para que a cobra não pudesse morder mais ninguém, segundo eles desta forma não matavam a cobra e eliminavam o perigo.
Quanto aos bugios a coisa era diferente, pois destes eles nem conseguiam chegar perto, quando se aproximavam os danados faziam as necessidades fisiológicas na mão e atiravam nos agressores, e o cheiro não era nada bom. Por um lado era muito engraçada a estratégia de defesa, por outro isso dava uma boa ideia, mas deixa pra lá essa é outra história. Quando a saída é para caçar tem que trazer algum animal para casa e nem cobras nem bugios eram boas ideias. Sobrava os tamanduás, só que os tamanduás tinham garras afiadíssimas que podiam matar uma criança como eles caso desse um “abraço de tamanduá”.
Quando um tamanduá é agredido ele de apoia na cauda e patas traseiras, levanta-se como se estivesse de pé, abre os braços e quando o agressor se aproxima joga-se contra ele abraçando-o fortemente e cravando as unhas (garras) nas costas do agressor, podendo matar até mesmo um animal bem maior do que ele. Mas como falei anteriormente era frio e nesta época todos os animais ficam mais lentos, inclusive os tamanduás.
Grandes conhecedores dos hábitos e costumes dos animais selvagens, porque conviviam mais com estes do que com outros humanos, os irmãos Piovesan desenvolveram técnicas especializadas para a captura dos mais diversos animais que viviam nos matos e peraus que frequentavam. Uma era para tamanduás.
A técnica exigia um ferramental específico: uma taquara com uns dois metros ou mais e um toco de madeira, meio apodrecida, de mais ou menos um metro de comprimento por uns 25 centímetros de diâmetro. A estratégia consistia em provocar o animal com a taquara, cutucar, assim ele assumia a posição de defesa que na verdade era a posição de ataque. Fazendo bastante barulho eles, menos um, ficavam na frente do animal provocando-o até ele ficar no ponto de atacar. O Piovesaneto que não ficava provocando o bicho fazia uma volta por trás sem ser notado carregando o toco de madeira, num determinado momento, que eles conheciam por experiência o toco era passado sobre a cabeça do animal e colocado em sua frente. O tamanduá agarrava-se firmemente no toco cravando suas garras e ficando preso.
A piazada então tomava o caminho da casa, carregando o toco com o tamanduá, inofensivo por estar abraçado firmemente ao toco. Isso é um abraço de tamanduá.

Uma história para ficar na história…

Há 14 anos na primeira festa dos Piovesan, os descendentes de Giovanni Marco, em Frederico Westphalen, Um maluco subiu ao palco para fazer um agradecimento e expôs uma ideia simples:
– O livro da genealogia está perfeito, foi uma pesquisa exaustiva e bem conduzida que resultou numa obra de valor incalculável como documento histórico. Agora é hora de começar outro, com aquilo que os Piovesan sabem fazer de melhor, “contar histórias”, histórias do pai, dos tios, dos avós, enfim aquela história viva que se renova a cada vez que é contada, que muda as versões de acordo com os sonhos e a visão de cada um, a história viva.
O maluco daquela hora era eu.
A partir de lá fui espalhando a ideia e a vontade de fazer algo que se identificasse, principalmente com o que eu conhecia do nono, o “Toni Torccio”, e de meu pai, o “Tio Lino”, que contava histórias e era capaz de transformar qualquer pequeno incidente do dia a dia numa bela história. Falei muito desta ideia com os tios Abel, Pio, Eulália, Thereza, Maria e Odila, todos foram simpáticos com a ideia, mas me faltava coragem para começar e a história estava quase sendo esquecida.
Em Janeiro de 2010, uma Piovesan, mais maluca do que eu, praticamente organizou sozinha a festa dos descendentes do “Toni Torccio”, nesta época já era de domínio público o desejo de ter um livro das histórias da família. A partir daquela beleza de festa não foi difícil de convencer a Silvia a assumir a frente da história, que continuava ainda no mundo das idéias.

A família Toni Torccio por ocasião dos votos da irmã Thereza. Da esquerda para a direita: Maria, Odila, Achiles, Toni, Pio, Thereza, Lino, Elizabeth, Abel, Eulália e Ignes.

A família Toni Torccio por ocasião dos votos da irmã Thereza. Da esquerda para a direita: Maria, Odila, Achiles, Toni, Pio, Thereza, Lino, Elizabeth, Abel, Eulália e Ignes.

Fizemos uma reunião na casa da tia Odila para dar o pontapé inicial ao livro, finalmente com a doença do tio Pio, a ideia veio com toda a força e a Silvia, que já estava coletando dados e histórias prometeu a ele que o livro sairia.
Desde então a Silvia e eu, com algumas colaborações estamos fazendo o livro acontecer, mas… sempre existe um mas. Se não tivermos a colaboração de vocês primos, não teremos histórias para contar e o livro vai se resumir na história do tio Abel e do tio Lino e naquilo que conhecemos e ou eles contaram de suas famílias. Está na hora. Enviem-nos histórias de suas famílias, de quando vocês eram crianças, de como viviam seus pais e irmãos, de como era sua casa, sua vida. Não se preocupem com a qualidade do texto, mas mandem detalhes e se tiverem fotos, nos faremos as correções e adaptações necessárias para editar a “História da família Toni Torccio” que é a história de suas vidas.
Este Blog é nosso ponto de encontro façam comentários que anexaremos à história. Também podem mandar textos para o Facebook, anexo em mensagens ou por e-mail.

Tempo de chuva – Tempo de pescaria

Para quem nasceu e se criou na roça sabe muito bem que desde criança sempre tem um servicinho para fazer. Na roça se trabalha de segunda a sábado, mas algumas tarefas são de segunda a segunda. Ou algum de vocês já experimentou ficar um dia sem comer, é claro que algumas práticas cristãs sugerem ocasionalmente dias de jejum, mas eu não conheci nenhum porco, vaca, boi, cavalo ou outro animal cristão e adepto desta prática. Logo, folga somente se tem dos trabalhos da lavoura nos dias de chuva, quando não dá para trabalhar na capina, plantio, colheita ou outra tarefa.

Colheita do milho, uma das tarefas que não pode ser feita em dias de chuva.

Colheita do milho, uma das tarefas que não pode ser feita em dias de chuva.

Uma prática comum, em dias de chuva, lá em casa, era selecionar o milho no paiol, descascar e debulhar milho para a moagem, afiar as ferramentas ou, a melhor das tarefas em dias de chuva, ir pescar. Tem cada história de pescaria que daria um livro só delas. Até aqui estou descrevendo o que os filhos do Lino faziam na sua infância e juventude. É claro que aprendemos com ele esta rotina, e ele certamente aprendeu com o pai dele, o nono.
Vejamos um exemplo: chove a noite toda, no outro dia a gente não pode carpir, pois a terra está muito molhada, segunda opção “rastolhar” o milho no galpão, Uma atividade divertidíssima: limpa-se dois cantos do galpão e começa a brincadeira. As espigas bonitas, bem fechadas, são atiradas para um dos cantos, elas vão durar mais tempo antes de criar carunchos, serão o milho principal aquele que deve durar até a nova safra, servirão de semente e de reserva. As espigas com palha aberta e os “restolhos” aquelas menores e não bem formadas vão para o outro canto para consumo imediato. O início do trabalho até que é meio chato, mas a medida que o monte de milho a selecionar começa a diminuir entram em cena os cachorros e os gatos – isto mesmo – os cachorros e os gatos, pois sempre tem algum camundongo que se esconde no meio do milho, e a medida que o monte de milho diminui eles vão ficando encantonados e começam a fugir, aí entram os cães e gatos na caçada. É muito divertido, é uma tarefa para dia de chuva.
Na nossa história tudo isso já tinha sido feito e continuava a chover, então a opção é ir pescar. Neste caso sempre é agradável a companha de alguns primos: O Orlando, o Eliot, o Qiude Zanon e por aí vai, vizinhos também vale. Uma boa prática é começar perto da usina Franciscana (hoje CELETRO) e ir se deslocando rio abaixo,  até perto dos Dalla Nora. Neste trajeto dá pra fazer uma boa pescaria, é claro que às vezes tem alguma melancia nalguma roça perto do rio, ou um milho verde pra assar. E se der sede, bah! A água do rio está suja devido à chuva então a saída é procurar alguma fonte nos barrancos e tomar a água com um canudinho de taquara. O canudinho de taquara é de grande utilidade, pois permite que se beba água de um lugar quase inacessível de outra forma, como faziam os bois do Lino nos campos de Palmeira onde as fontes d’água são profundas.
Outra utilidade do canudinho é tomar “graspa” do “garrafonetto” do Toni pela fresta na parede do galpãozinho. Só que às vezes o canudinho (cannutcho) caia dentro do garrafão, mas isto não era problema, pois tinha bastante taquara por perto e a gurizada sempre levava consigo alguma ferramenta de corte como canivete ou “brítola”. Pronto agora já sabemos como a “graspa” do Toni foi transformada em “cannutchi”.

Restolhar – Separar as espigas pequenas e abertas do milho guardado no paiol.

Brítola – Canivete em forma de foice muito comum entre os descendentes de italianos.

O champanhe do tio Jorge.

Neste vale residia o tio Jorge, vizinho do tio David

Neste vale residia o tio Jorge, vizinho do tio David

A foto original do autor encontra-se no Panoramio

Eu estava com 16 anos, e era a primeira vez que eu ia a Nova Palma, para a primeira missa do padre Reinaldo Piovesan,  quis então aproveitar para conhecer os lugares de que a mãe e o pai nasceram, e não podia faltar Linha Base. E foi por isso que fui dormir na casa do tio Pio para acordar cedo na terça-feira para pegar o ônibus até linha base e ficar um dia na casa do tio David e tia Maria.
O sol ainda não tinha aparecido, em Nova Palma ele não costuma aparecer tão cedo, mas os galos da redondeza já tinham cantado bastante quando o visitante acordou meio sonolento e começou a sequencia de atividades programadas para o dia: acordar, tomar café, arrumar a mochila, se despedir dos tios e dos primos e sair apressadinho para a rodoviária, pois afinal ônibus não espera, mas estava em cima da hora e o café foi sacrificado, afinal o tio David não ia negar café para um sobrinho. Já estávamos dobrando a esquina perto da rodoviária quando o primo Tarcísio, que caminhava mais depressa avistou o dito cujo que já dobrava a esquina em direção a Linha Base. A solução era esperar o próximo horário, no outro dia de manhã.
De volta para casa surgiu a ideia de fazer o trajeto a pé, quando falamos para o tio Pio ele achou a ideia boa, afinal são apenas oito quilômetros, mas a tia Clementina achou que seria loucura fazer uma caminhada daquelas. Argumento daqui e dali, prós e contras analisados ficou decidido, o trajeto seria feito a pé, e para encurtar o caminho, o Tarcísio e eu iriamos subir o morro do Pelegrin e sair na estrada lá perto do Olivo Santi. Aí deu tempo para tomar café arrumar a mochila decentemente e saímos morro acima. (Esta viagem é uma história completa que vai ficar para outra oportunidade.)
Chegamos à casa do tio lá pelas 11 horas da manhã, como o Tarcísio era de casa simplesmente sumiu pelos potreiros, foi andar a cavalo, e não sei mais o quê. Eu só conhecia o tio e a tia então comecei a ser apresentado para um e para outro e a conversa durou até a hora do almoço. Depois do almoço o tio foi me mostrar as lavouras, o gado, os porcos e um pouco da redondeza. Foi quando pedi a ele se o tio Jorge Trentin morava perto, ele em disse que era bem pertinho e se eu quisesse até poderíamos ir lá. Não esperei ele terminar a frase e concordei, pois estava louco para conhecer mais aquele pedacinho de mundo. Já no final da tarde pegamos uma trilha que levava das lavouras dos Pegoraro às dos Trentin e não demorou muito estávamos lá. O tio Jorge e a tia Ângela nos receberam bem ao estilo dos Trentin, lamentando que não tivéssemos avisado para fazerem uma janta à altura das visitas. Outro contratempo é que os guris iam para o ensaio do coral e somente o casal ficaria em casa, o que não dava nem uma mesa de cinquilho, a solução seria trissete. Enquanto a tia fazia a polenta o tio Jorge apareceu com uma garrafa de champanhe para tomarmos como aperitivo, era um champanhe do ano passado que ele não conseguiu vender porque tinha ficado muito forte, a uva amadureceu demais, ficou com grau alcoólico muito alto. Era um champanhe seco que parecia ferver dentro da boca, estralava bolhinhas entre a língua e o céu da boca, confesso que não achei nada de errado.
Para a janta o tio trouxe mais uma garrafa de champanhe, depois enquanto jogávamos conversa fora, entre uma partida e outra de trissete, acho que tomamos mais umas quatro garrafas de champanhe. Já era quase meia noite quando os guris voltaram do ensaio, aí percebemos que já era hora de ir para casa, inda mais que eu tinha que tomar o ônibus para Júlio de Castilhos no outro dia. (onde fiquei dois dias na casa do Arlindo e da tia Inês, primos me cobrem e complementem esta história).
No caminho, apesar de estarmos os dois a chutar pedras, por conta do champanhe, iluminando o caminho com um tição em brasa que o tio ia sacudindo para alumiar o caminho, insisti com o tio que eu não poderia perder o ônibus no outro dia e que, se fosse necessário me jogasse um balde de água. Chegamos em casa e todos estavam dormindo, o tio me indicou o quarto, e eu caí na cama como uma pedra.
O sol já tinha dado o ar da graça, em Linha Base ele levanta cedo, o café já estava pronto, todo mundo tinha levantado, feito muito barulho, e eu continuava roncando. Não podia perder aquele ônibus, e o tio David muito consciente de sua responsabilidade de acordar o sobrinho, bateu a porta do quarto e como não obteve resposta, entrou. E agora – não é que ele continua a dormir como um anjinho – (Viu pelo menos enquanto durmo pareço um anjinho). Mas esta hora o ônibus já estava a caminho, o tio foi até a janela e abriu para deixar entrar a luz do sol e nada do sobrinho acordar. Algo deveria ser feito, foi aí que ele decidiu assumir sua função de despertador, foi até a cozinha serviu-se de um objeto e chegou na janela…
Chuá! Até que ele foi legal, só veio com uma caneca de água fria em lugar do balde que eu tinha pedido…
Vesti-me, lavei o rosto tomei café e desta vez não perdi o ônibus rumo a Júlio de Castilhos.

Tio David em Porto Alegre

Em função do acidente e por estar paraplégico o tio David tinha problemas de saúde, estava bastante debilitado e no ano de 1979, esteve internado na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre. Neste tempo ficou bastante só, pois a tia tinha que ficar em casa cuidando das crianças, e além da Tia Odila e eu não tinha outros parentes por aqui, quando descobrimos que ele estava internado a Catia, minha namorada, e eu fomos visita-lo, a Catia trabalhava em Porto Alegre, não muito longe da Santa Casa. Como eu morava em São Leopoldo somente podia visita-lo nos fins de semana então pedi para ela se poderia ir algum dia durante a semana, ela foi algumas vezes no intervalo do almoço, mas ficava muito apertado o tempo, pois o horário de visita não coincidia totalmente com o do almoço dela fazendo com que as visitas fossem muito curtas. Foi aí que ele pediu uma autorização para ela fazer visitas fora de hora, as enfermeiras concederam a ela uma autorização para visita-lo todos os dias no final da tarde ocasião em que podia ficar mais tempo.

A Catia sempre visitava ele no final da tarde.

A Catia sempre visitava ele no final da tarde.

Falando hoje com a Catia procuramos entender um pouco do que foi a vida dele por aqui. Segundo ela ele estava muito sentido, hoje diríamos em depressão, porque não podia mais fazer o trabalho da roça e sustentar a própria família. Uma de suas maiores inquietações era justamente não poder acompanhar o crescimento de seu filho menor, ele estava perdendo de ver seu desenvolvimento, não podia brincar com ele, e por estar longe sentia muita falta da família. Segundo a Catia “hoje eu entendo, o que ele sentia era depressão, naquela época não se falava disso, ele chorava muito e sentia muita falta da família, sempre demonstrava o carinho que sentia pelos filhos e pela tia, e quando eu chegava ele gostava de falar da vida, de quando trabalhava na lavoura, dos filhos e em especial do nenê. Às vezes pegava na minha mão e simplesmente ficava em silencio enquanto as lagrimas rolavam, outras vezes me abraçava efusivamente e falava da família, ria e parecia de bem com a vida.”

... as vezes riamos muito juntos vendo fotos e contando histórias da família e do trabalho. (Catia)

… as vezes riamos muito juntos vendo fotos e contando histórias da família e do trabalho. (Catia)

As vezes fico imaginando como ele deveria se sentir, acostumado a trabalhar, fazer serviço pesado, ficar preso a uma cadeira de rodas ou dentro de um hospital sem fazer nada deve ter sido angustiante, mais estranho ainda era ficar sem nenhum familiar por perto tendo apenas a namorada do sobrinho para visita-lo. Eu visitava ele nos fins de semana aí nós falávamos dos poucos bons momentos que tivemos juntos quando eu visitei ele em 1970, (a visita ao tio Jorge Trentin) Comigo ele sempre foi brincalhão, mesmo estando com a saúde debilitada nunca perdia o humor.

A última vez que me encontrei com ele.

A última vez que me encontrei com ele.

Quando ele deu alta e voltou para casa só ficou a saudade, por isso, quando nos casamos em maio, fizemos uma turnê pelo Rio Grande do Sul e fizemos questão de visitar o tio, foi a última vez que vi ele.

A vinda da família Piovesan ao Rio Grande de São Pedro do Sul.

Segundo Pistóia (1999), a história mais remota das raízes da arvore genealógica da família Piovesan, tem origem nos montes Vêneto da região norte de Verona, onde se encontram um pequeno povoado chamado Piovezzano, distante cinco e meio quilometro das margens do poético lago de Garda Benaco. Essa hipótese de o clã provir da península vem colaborando pela fisionomia, cor do cabelo e dos olhos dos descendentes que ostentavam considerável carga de sangue germânico.

No entanto a família de Giuseppe Piovesan saiu da região do Vêneto, que fica situada no nordeste da Itália, fora da Península Itálica onde se localiza o contorno norte do mar Adriático (uma vasta planície entre os Alpes e a Laguna Veneta, onde estão as ilhas da cidade de Veneza e arredores).

Em Santa Cristina, moravam no segundo piso de uma casa onde, no térreo criavam ovelhas. “As casas eram construídas umas ao lado das outras, com falta de luz e pouca ventilação, os hábitos de higiene eram escassos e o lixo se acumulava nas ruas estreitas. As casas dos mais pobres eram construídas de duas peças, acrescida de uma estrebaria. Quando os invernos eram muito rigorosos, era costume passar todo o tempo junto aos animais, para poder se aquecer. Com isso a saúde, em contato com o bafo dos animais torna-se precária”. (Righi, 2001).

“A alimentação era pobre, baseada exclusivamente em cereais e hortaliças com alguns produtos derivados do leite. A polenta constituía a base do almoço e era sempre acompanhada de nabos, batata, feijão e repolho. O peixe era escasso, o mesmo ocorrendo com as bebidas, exceto os vinhos”. (Righi, 2001).

Da mesma forma que varias famílias da região do Vêneto, Giuseppe Piovesan, viúvo decidiu vir para o Brasil juntamente com os filhos Luiggi (25 anos) e sua esposa Elizabetha da mesma idade e seu filho Giuseppe, neto com 6 meses, Ângelo (18 anos), Luiggia (16 anos), Giovanni Marco (14 anos), Ângela (12 anos) e Maria (9 anos). Zarparam em 21 de dezembro de 1887, do Porto de Genova, Embarcaram no Vapor Adria e chegaram em Ilha das Flores no Rio de Janeiro em 15 de janeiro de 1888,dali saíram em 10 de fevereiro de 1888 rumo ao Rio Grande do Sul (o estado de posição mais meridional do Brasil). Ficaram 26 dias no Rio de Janeiro a espera de sua bagagem que havia sido extraviada. Foram então aconselhados a prosseguir viagem chegaram a Porto Alegre (capital do Rio Grande do Sul) em 19 de fevereiro de 1888 e sobem o Rio Jacuí até a margem do rio Taquari onde apanham um trem até a estação colônia, hoje Camobi. Com o transporte muar do governo sobem a Silveira Martins e se alojam em barracões depósito de imigrantes junto à praça da comissão de terra dessa ex-colônia.

Foto da família de Giovanni Marco na ocasião do casamento de Antonio e Elizabeth

Foto da família de Giovanni Marco na ocasião do casamento de Antonio e Elizabeth