Hoje meu pai faria 86 anos, hoje também celebro meus 35 anos de casamento, talvez meu casamento tenha sido a festa surpresa para ele quando fez 41 anos. Ele sempre gostou de festas surpresa e contava muitas histórias destas festas que sempre eram muito divertidas, e enfeitadas como ele gostava de contar. Dentre as muitas histórias de festas surpresa de aniversário, esta era uma das que o pai mais gostava, a festa surpresa de 41 anos do nono Toni, oportunamente contarei outras.
Foi no ano de 1940, o pai comemorava 12 anos e o nono Toni 41, segundo a tradição da comunidade foi planejada uma festa surpresa para o Toni. Já tinham sido roubadas as galinhas na semana anterior e esperava-se que o vinho fosse roubado no dia, ou pelo menos os aniversariantes contribuíssem com ele. Foi assim que a vizinhança começou os preparativos para a festa, assaram os frangos na casa do Afonso Vestena, outros fizeram as cucas, pães, grustolis e outras iguarias e combinaram chegar à festa com tudo pronto, a nona faria uma grande polenta e prepararia uma salada.
Para fazer esta combinação decidiram mandar recado pelo Pio. Os visitantes entregariam os ingredientes e comidas da festa para ele que estaria esperando na saída da pinguela e levaria para dentro discretamente pelos fundos. Os convidados chegariam na casa de mãos abanando como quem veio para uma rodada de cinquilho e fariam de conta que nem lembravam do aniversário e nenhum sabia que o outro também viria. Somente falariam do aniversário quando todos tivessem chegado. Neste meio tempo, enquanto os visitantes iam se acomodando na sala para o jogo, o Pio e a nona, que a esta altura já estaria fazendo a polenta, organizariam as comidas.
Só que aconteceu um problema, o recado que deveria ser dado para o Pio foi dado para o Lino, nenhum dos organizadores se deu conta que ele também era aniversariante. Ele, muito pucha saco do pai contou tudo para ele e os dois passaram a planejar a surpresa para a festa.
Primeiro tinham que atrasar a nona o quanto pudessem, para isso ficaram na lavoura até bastante tarde. Quando chegaram em casa o nono foi para a cozinha e ficou lá, sentado na caixa de lenha, o Lino foi para a saída do carreiro da pinguela para pegar as comidas e levar para casa neste caso esconder. Tudo pronto e ficaram a postos, a nona não sabia de nada e começou a fazer a janta normalmente, os outros ficaram pra cá e pra lá como sempre faziam antes da janta, o Lino sumiu, quanto perguntaram por ele o nono disse que tinha ido tomar banho no rio, ninguém questionou porque sabiam que ele ia mesmo quando era frio.
Quando começou escurecer começaram a chegar os convidados os Vestena, o Angelim Girardello, o Guerino Rossato os cunhados Zanon… Cada um que chegava, o Lino do meio do mato cochichava:
– “dame qua cossa te gue aportá”(me dê o que você trouxe), e assim um por um foram chegando e dando para o Lino o que tinham trazido para a festa. Tudo foi guardado no galpãozinho onde o nono guardava o vinho e as graspas perto do rio.
Na cozinha o nono ia recebendo os convidados e fazendo questão que ficassem na cozinha, que estava mais quentinho, tomando chimarrão, e “zô mato” (dá-lhe chimarrão). Chegou a comentar que estava esperando eles para depois da janta para um carteado. Passava algum tempo e chegava mais um, e mais um, e a nona começou a ficar preocupada porque não estava preparada para dar janta para toda aquela gente. Quando já tinham chegado uns sete ou oito eles começaram a insistir que era melhor irem para a sala, pois lá tinha o banco, e a mesa maior. Olhavam para a nona e para o Pio e nenhum dos dois parecia saber de nada, ninguém falava nada e tentavam se comunicar por gestos. O nono fazia de conta que não sabia de nada e finalmente concordou em ir para a sala para deixar a nona fazer a janta mais sossegada. Foram para a sala, a esta altura a situação já começava ficar tensa, a piazada já estava dentro de casa e ninguém percebeu que o Lino chegara mais tarde. Foi aí que o nono pediu para ele buscar vinho para a turma, ele pegou um bule e lá se foi, como estava demorando o nono saiu para ver o que tinha acontecido, na verdade isso estava combinado, era para saber como estavam as coisas e se ele tinha feito tudo direitinho.
Neste meio tempo a turma foi para a cozinha pra saber se tava tudo pronto e descobriram que não tinha nada, a não ser a grande polenta que a nona fez. O nono voltou falando alto com o Lino para que eles tivessem tempo para voltar para a sala. Foi aí que ele resolveu convidar todos para jantar: polenta, radicci e vinho, e “qualque toquetto de salado” (algum pedaço de salame), era tudo o que tinha. O Toni estava muito a vontade enquanto a nona estava envergonhada com a situação e mais ainda os convidados, que não sabiam o que tinha acontecido.
Quando a mesa estava servida e todos ao redor com cara de decepção e não entendendo o que estava acontecendo, ele disse que ia buscar mais vinho e saiu. Algum tempo depois voltaram ele e o aniversariante com as galinhas assadas, cucas, pães, grustolis e outros quitutes que os visitantes trouxeram. Aí eles anunciaram que era uma festa surpresa para ele e o Lino que estavam de aniversário.
Parece que os dois tinham um grau de cumplicidade bem grande principalmente quando se tratava de fazer alguma arte. O pai contava que se divertiram bastante naquela noite e ficaram até a madrugada festejando e cantando.
Algumas outras histórias de festas de aniversário ainda serão contadas…